O papagaio do vizinho

         - Tem nada pra fazer não, é, menina?
         É com essa frase que eu desperto do meu transe esse sábado. Era minha empregada fazendo careta pra mim enquanto analisava a situação. Eu com a roupa suja de tinta ainda fresca, sentada no muro, observando o papagaio do vizinho da casa de trás. Era uma cena meio fora do padrão, mas ela já devia ter se acostumado, eu acho. Pelo menos depois que me viu descendo do telhado às 5:30 da manhã.
         Era uma tarde muito bonita e ventilada, uma daquelas tardes de sábado quando eu não tenho realmente nada pra fazer, como ela falou, e saio pela casa bailando leve e sorridente procurando algo pra fazer enquanto espero uma ligação do meu amor que deve ainda estar dormindo há alguns muitos quilômetros de distância de mim. Então eis que acho algo pra fazer. Algo muito gostoso, na minha visão, mas não na da minha empregada. Mas, bem, faz alguns meses desde que deixei de vez de me importar com o que pensam os outros sobre mim, então...
         O negócio é que, quando eu estava ali sentada, sentindo o vento no corpo e olhando o papagaio do vizinho, percebi uma coisa. Percebi outros passarinhos ao redor da gaiola do papagaio prisioneiro – com o perdão da expressão, pois já o vi muitas vezes passeando fora dela, mas era o que parecia e que me fazia imaginar o que o papagaio estaria pensando naquele momento se disso ele fosse capaz. Será que estaria triste?
         Algo a se pensar. Porque, veja bem, digamos que o papagaio nunca tenha sentido o gosto da verdadeira liberdade, nunca tenha saído por aí voando às soltas como um passarinho comum, como poderia ficar triste por isso, já que já nasceu nessa posição? Deveria ser mais do que costume, seria sua realidade.
         É nessa hora que percebo que é isso o que a maioria das pessoas fazem. Sentem falta do que nunca tiveram. Olham pro nada e choram de nostalgia por um tempo que nunca passou, que nunca existiu. Por pessoas que nunca tiveram e, nesse caso, pela liberdade que nunca lhes foi dada. É assim mesmo, sempre foi e sempre será, humanos são humanos, pássaros são pássaros e corações são corações – como naquela música péssima de forró (forró?). E corações tendem a sentir, mesmo quando lhes falta motivo. Principalmente nessas horas.
         Sabe, os seres humanos são seres engraçados... Um dia eu canso de rir e viro um ser pássaro. Nesse dia, eu vou voar bem alto, até onde não se enxergue mais os outros seres. Seres humanos e seres pássaros. São muito bonitos, sim, mas um tanto quanto burrinhos.

Muito bonita essa vida

    Muito bonita essa vida, embora pessoas nos façam chorar. Mas essas pessoas não são vida, eu sou. Vida bonita como a vida, obra de arte maior, obra prima por parte de pai, segundo grau na árvore genealógica.
    Esta noite que já virou madrugada rolou-me lágrimas e tinta acrílica, porque facial tava faltando. Então seguem anexos registros do sentimento materializado, coisa rara, coisa bonita de se ver mas doída de sentir.

Às vezes, dói que a pessoa chora

 Às vezes, a pessoa chora que sangra

 

Às vezes chora que se afoga...


Mas em todas as vezes tudo acaba muito bem.
Então boa noite pra você e pra mim, que eu to cansada pra caramba.
Nossa, que dia.